segunda-feira, 11 de julho de 2011

Presidenta eleganta.

Miriam Rita Moro Mine - Universidade Federal do Paraná.


No português existem os particípios ativos como derivativos verbais. Por exemplo: o particípio ativo do verbo atacar é atacante, de pedir é pedinte, o de cantar é cantante, o de existir é existente, o de mendigar é mendicante... Qual é o particípio ativo do verbo ser? O particípio ativo do verbo ser é ente. Aquele que é: o ente. Aquele que tem entidade.


Assim, quando queremos designar alguém com capacidade para exercer a ação que expressa um verbo, há que se adicionarem à raiz verbal os sufixos ante, ente ou inte. Portanto, à pessoa que preside é PRESIDENTE, e não "presidenta", independentemente do sexo que tenha. Diz-se: capela ardente, e não capela "ardenta"; se diz estudante, e não "estudanta"; se diz adolescente, e não "adolescenta"; se diz paciente, e não "pacienta". Um bom exemplo do erro grosseiro seria:


"A candidata a presidenta se comporta como uma adolescenta pouco pacienta que imagina ter virado eleganta para tentar ser nomeada representanta. Esperamos vê-la algum dia sorridenta numa capela ardenta, pois esta dirigenta política, dentre tantas outras suas atitudes barbarizentas, não tem o direito de violentar o pobre português, só para ficar contenta".


Por favor, pelo amor à Língua Portuguesa, repasse essa informação...

13 comentários:

  1. Sérgio,

    Os principais gramáticos brasileiros registram a palavra “presidenta” como correta.

    Em seu Dicionário de Masculinos e Femininos, Aldo Canazio (1960) registra presidenta como feminino de presidente (ao lado de [a] presidente como substantivo de dois gêneros).

    Desde sua 1ª edição (1963), a Moderna Gramática Portuguesa de Evanildo Bechara já registrava e abonava essa forma feminina:

    “Podemos distinguir, na manifestação do feminino, os seguintes processos [...] com a mudança ou acréscimo ao radical, suprimindo a vogal temática [...] Os [terminados] em –e uns há que ficam invariáveis, outros acrescentam –a depois de suprir a vogal temática: alfaiate à alfaiat(e) + a à alfaiata.

    Variam:

    alfaiate – alfaiata
    infante – infanta
    governante – governanta
    presidente – presidenta
    parente – parenta
    monge – monja
    (p. 84, grifo nosso)”

    Celso Pedro Luft, em seu Dicionário Gramatical da Língua Portuguesa (1966), ensina que “os substantivos terminados em e são geralmente uniformes (…); há, porém, alguns que trocam o e por a: elefante – elefanta; governante – governanta; infante – infanta;[...] ; parente – parenta; mais raros: [...] giganta; hóspeda; presidenta; alfaiata. Em ABC da Língua Culta, o autor reafirma: “[...] substantivo que se pode tomar como comum de dois gêneros (sexo) para ‘pessoa que preside’: o presidente, a presidente; mas também comporta feminização flexional: a presidenta”.

    Rocha Lima (2007), em sua Gramática Normativa da Língua Portuguesa, reconhece: “a força do uso já consagrou as formas flexionadas infanta, parenta e presidenta” (p. 73).

    Luiz Antonio Sacconi (2010), em Nossa Gramática Completa Sacconi, também registra “presidenta” como o feminino de presidente (p. 133).

    Cegalla (2008) diz o seguinte em seu Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa: “É forma dicionarizada e correta, ao lado de presidente. A presidenta da Nicarágua fez um pronunciamento à Nação. / A presidente das Filipinas pediu o apoio o apoio do povo para o seu governo (p. 336).

    Finalmente, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (2009), que registra todas as palavras em uso oficial na língua portuguesa, legitima a palavra (p. 674).

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  2. Davi,

    os autores que você cita confundem particípio ativo com substantivo e adjetivo. "Presidente" não é substantivo nem adjetivo. Presidente é o estado ou condição da pessoa que preside. A raiz é latina, "presidens", o estado ou condição daquele (ou daquela) que preside. "Presidenta" é uma "mutação à brasileira". Essa mutação cria uma divisão entre a língua culta e a língua inculta. E, ao criar essa divisão, acaba dividindo também as pessoas entre cultas e incultas. A função dos dicionários e gramáticas é manter e transmitir a "lógica interna" da língua, os seus recursos linguísticos, de modo que todos possam "falar a mesma língua", e os semelhantes possam se entender e se reconhecer como semelhantes. Mas, muitos dicionários são meras coleções de palavras, assim como corre o risco de se tornar a "língua brasileira". Assim como a língua sofre divisões, as pessoas e a sociedade também sofrem. Eu acredito que as pessoas que usam a forma errada - "presidenta" - consciente ou inconscientemente, visam criar divisão e discórdia. "Dividir para conquistar" - já diziam os romanos.

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  3. Comentário de Davi Miranda, encaminhado ao editor do blog – parte I:

    “... “Os autores que você cita confundem particípio ativo com substantivo e adjetivo. "Presidente" não é substantivo nem adjetivo. Presidente é o estado ou condição da pessoa que preside. A raiz é latina, "presidens", o estado ou condição daquele (ou daquela) que preside”.

    Não, não confundem: eles têm consciência da evolução, da variação e da mudança numa língua. E daí que 'a raiz é latina'? O que o latim tem a ver com o português além da relação de proveniência? O que obriga uma língua a manter a estrutura e a natureza de algo que não é a sua própria? Por que fazer, sempre, analogias de questões da língua portuguesa com o seu caso correspondente em latim?

    A terminação -nte é um sufixo originário do latim –ns, -ntis, desinência do particípio presente que, na língua portuguesa, resultou em adjetivos ou substantivos deverbais (formados a partir de verbos) com a noção de ‘agente’, como em assaltante, ouvinte, servente.Por si só, esse particípio presente não vingou na língua portuguesa, tendo se mantido apenas no francês e no italiano. Em O Português Arcaico (2006), a linguista Rosa Mattos e Silva observa que, embora o particípio presente ainda pudesse apresentar remanescentes verbais no período arcaico, apenas se fixou no português contemporâneo “como adjetivo, substantivo ou em outras classes de palavras (presente, constante, tirante, durante etc)” (p. 121). No artigo Flexão Verbal do Português, O filólogo Joseph Maria Piel esclarece o desaparecimento dessa forma nominal de verbo:

    Tendo o gerúndio pouco a pouco assumido, em português, as funções verbais do particípio, não admira a ausência desta última categoria no quadro moderno da conjugação portuguesa.” Como exemplo, o autor cita uma obra em que as formas estante, dizente, dorminte, em sua versão mais antiga em português, mudaram posteriormente, a partir do século XV, para estando, dizendo, dormindo.

    O autor também observa que é natural que a língua não eliminasse simultaneamente todos os particípios em -ante, -ente, -inte [...]. Constituem reminiscências do particípio as formas invariáveis, equivalentes a preposições, salvante, tirante, passante [...]. Abstraindo destes casos, os particípios tornaram-se adjetivos: semelhante, doente, ou substantivos: figurante, tenente, pedinte [...] (p. 220). Por isso, e só por isso, no português contemporâneo, esse particípio latino ainda é reclamado como fator remoto da (relativa) uniformidade dos adjetivos (e substantivos) terminados em -nte em português.

    A única justificativa dada para condenar a variação do vocábulo presidente é vinculá-la obrigatoriamente à sua uniformidade latina original. Ora, o fato de os adjetivos terminados em -nte serem, como já no latim, uniformes em nada justifica ou obriga, necessariamente, a preservação de tal uniformidade numa língua neolatina.

    Vale observar o que diz a Gramática comparativa Houaiss: quatro línguas românicas (2010), ao mostrar o quanto as línguas derivadas do latim comportaram-se de modo peculiar/intrínseco e divergiram em suas formações de gênero:

    Há nomes e adjetivos em -a e em -e que podem ser uniformes quanto ao gênero [...] há palavras terminadas em -e que em português, espanhol e italiano são uniformes para o masculino e o feminino, mas que em francês apresentam uma diferença entre a forma masculina e a forma feminina. [...] no que diz respeito aos adjetivos, o italiano permaneceu fiel à terminação e- do latim; o português e o espanhol conservaram-na em palavras como grande ou abandonaram-na em casos como cruel, fácil, cortês e jovem/joven. Estas duas línguas adotaram a desinência -a para formar o feminino de alguns adjetivos que etimologicamente pertenciam ao grupo dos uniformes (p. 98, grifo nosso)...”

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  4. Comentário de Davi Miranda, encaminhado ao editor do blog – parte II:

    “...Mais adiante, no item oportunamente intitulado “O caso particular dos nomes de profissões”, temos:

    Numerosas profissões reservadas no passado aos homens são atualmente acessíveis às mulheres. As línguas comportam-se de maneira diferente em relação a esta nova realidade. Tal como o português, o espanhol e o italiano possuem em geral formas no masculino e no feminino para os nomes de profissões: profesor/profesora (espanhol), professore/professoressa (italiano); escritor/escritora (espanhol), scrittore/scrittrice (italiano).

    Em italiano, os vocábulos com o sufixo – essa para o feminino de certas profissões ou são antigos, como studentessa, professoressa, ou então foram criados mais recentemente, como deputadessa, avvocatessa (sendo avvocata mais freqüente), ministressa (forma rara). Muitas vezes continua a usar-se a unicamente a forma masculina para homem ou mulher: il deputato, l’avvocato, il ministro.

    Em francês, os femininos introduzidos há muito tempo na língua não levantam problemas: boulanger/boulangère, directeur/directrice, vendeur/vendeuse; pelo contrário, há numerosos outros nomes para os quais não existem femininos e que por isso exprimem só a função e não a pessoa: professeur, tailleur, peintre, juge, écrivain, médecin, guide, témoin. Assim, diz-se: Madame Durand, professeur, Madame le professeur (p. 99, grifo nosso).

    Como se vê, no que diz respeito à formação de gênero no feminino, cada língua neolatina desenvolveu flexões (ou derivações) distintamente, de acordo com suas respectivas peculiaridades, não seguindo necessariamente a lógica da estrutura vigente no latim. Não há, portanto, por que condenar no português a realização de uma determinada flexão (nesse caso, eu diria derivação) tendo como justificativa uma lógica determinista (nesse caso, a uniformidade dos adjetivos latinos terminados em -nte) que vigorava incondicionalmente FORA do português, numa língua hoje morta.

    " manter e transmitir a 'lógica interna' da língua..."

    Já que você fala em "lógica interna da língua", por que não consegue, então, admitir que o latim e o português, possuem, cada um, sua "lógica interna"?

    "Presidenta" é uma "mutação à brasileira".

    Não. Ela não é só brasileira como também (pioneiramente) lusitana: o termo surgiu originalmente em Portugal, conforme a 1ª edição do Dicionário Caldas Aulete (1881). Na literatura portuguesa, tem-se o registro impresso mais antigo da palavra na tradução da obra As Sabichonas (Les Femmes Savantes), do dramaturgo francês Molière, por meio do escritor português Antonio Feliciano de Castilho, em 1872:

    “Mais gratidão lhe devo, immortal presidenta” (p. 128)

    “À nossa presidenta, e às minhas sócias, peço se dignem perdoar-me o intempestivo excesso” (p. 153); “Nada, nada! Escusa, presidenta, de insistir mais” (p. 230)...”

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  5. Comentário de Davi Miranda, encaminhado ao editor do blog – parte III:

    “...Anos depois, no Brasil, Machado de Assis utilizaria o vocábulo em Memórias Póstumas de Brás Cubas (publicada pela primeira vez em 1881):

    “Na verdade, um presidente, uma presidenta, um secretário, era resolver as cousas de um modo administrativo”.

    E para lançar por terra a ideia de que a sufixação -nta é uma "mutação (apenas) à brasileira" (e mesmo que fosse apenas brasileira, não haveria problema algum nisso quanto à qualidade culta da língua), observemos: os estudos da linguista Rosa Virgínia Mattos e Silva (2006) constataram que

    No Cancioneiro Medieval Português aparecem sergente: sergenta e o sinônimo servente: serventa (‘servo’); [...] no Orto do Esposo, dos fins do século XIV, aparecem servente, sergente, mas também sergenta (p. 103-104).

    Viu só? Ainda acha que seria mera "mutação à brasileira"? Por que seria, se essa mutação já ocorria desde o português arcaico?...

    Para exemplificar outras variações da terminação -nte com outras palavras do português arcaico em uso até hoje, podemos citar infanta e parenta, substantivos surgidos no século XIII conforme o Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa (2010); giganta, publicado num romance de cavalaria em 1522, conforme Barros (1743); posteriormente, num período mais moderno da língua, teremos elefanta, registrado no século XVIII no Diccionario da Lingua Portugueza (SILVA, 1789); e governanta, originado em 1881 por influência do feminino do francês gouvernante (HOUAISS, 2001). Entre os casos que não se consolidaram na língua, Said Ali (1964) cita, em sua Gramática Histórica da Língua Portuguesa, as palavras comedianta e farsanta, utilizadas na literatura do período quinhentista e seiscentista (p. 62).

    Você certamente já ouviu falar, em algum momento de seus estudos, do padre português António Vieira, um dos maiores nomes da literatura barroca. Veja só isso:

    Não estariam, entretanto, grandemente convencidos os quinhentistas da correção desta linguagem se já hesitavam entre infante e infanta, como facilmente se vê na Crônica de D. Manuel por Damião de Góis. A forma infanta, tornou-se, contudo, a preferida por Antônio Vieira e outros, e prevaleceu (SAID ALI, 1964, p. 62).

    [...] acredito que as pessoas que usam a forma errada - "presidenta" [...]

    "Forma errada"? Quem disse, quem estabeleceu, que norma estabelece que "presidenta" é errado? As gramáticas normativas (como já constatamos) não o fazem... Então, baseado em QUE se pode afirmar, categoricamente, que essas pessoas usam a forma errada?



    [...] Mas, muitos dicionários são meras coleções de palavras, assim como corre o risco de se tornar a "língua
    brasileira.

    Em primeiro lugar, à exceção do primeiro autor, as citações não tratam de dicionários, mas sim das principais gramáticas (isto é, obras dos principais gramáticos brasileiros) nas quais a língua culta (em português) se baseia. Não estamos falando de meros professores de português com blogs e programas de rádio ou de TV. São os autores das mesmas gramáticas que estudantes, vestibulandos, concurseiros, universitários, professores, mestres e doutores (enfim, todos os membros do segmento culto da sociedade) leem e estudam (ou vai me dizer que você não conhece nenhum desses autores?).

    "[...] Corre o risco de tornar a língua 'brasileira'..."

    Mas que diabos de língua falamos então? Não corremos esse risco: já falamos uma língua 'brasileira'.

    Davi Miranda
    Revisor de textos
    surdocego@gmail.com...”

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  6. Ironicamente (ou “ironicamento”, “ironicamenta”?), o registro impresso mais antigo da palavra “presidenta” na literatura portuguesa, em 1872 pode ter sido um erro de grafia, proposital ou não. Na primeira hipótese, o autor da tradução para o português da obra “As Sabichonas” (“Les Femmes Savantes”, do dramaturgo francês Molière), Antônio Feliciano de Castilho pode ter querido ressaltar a conhecida ironia e sarcasmo dos textos de Molière. Alternativamente, Feliciano de Castilho pode ter deixado passar o erro nas provas de impressão, já que Castilho era cego, sendo obrigado a ditar toda a sua vasta obra literária.

    Que o termo „presidenta“ figure em dicionários lusitanos e outras obras não foi suficiente (ou “suficiento”, “suficienta”?) nem para dobrar a lógica do termo, nem para colocá-lo em uso. Esse termo é simplesmente (“ou simplesmento”, “simplesmenta”?) considerado errado em Portugal. Os dicionários são como os genomas. Eles absorvem as “mutações” da língua, mas a maioria dessas “mutações” não entra em uso. Estima-se que apenas cerca de 10% do nosso genoma constitui informação genética útil, o restante (ou “restanto”, “restanta”?) é “DNA sucata”.

    No Brasil, onde os limites entre o certo e o errado sao apagados, o “DNA sucata” está sendo reciclado. As raízes do “ultra equinotialem non peccavi” que orientou a formação da colônia estão fortes na cultura brasileira. O latim ainda está vivo no mundo. Ele é ensinado nas escolas alemãs, como disciplina optativa. Até há pouco tempo, também era ensinado nas escolas brasileiras. Agora não é mais. Nem o Português. Nem o Tupi-Guarani. São as mutações “à brasileira”...

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  7. Primeiramente, você falha quanto tenta fazer analogias forçadas com as formas inexistentes "ironicamenta", "simplesmenta", "suficienta" e "restanta". Isso só demonstra o quanto você desconhece os motivos pelos quais uma palavra tem seu uso abonado pela norma culta.
    "Ironicamente" e "simplesmente" são advérbios, não substantivos/adjetivos passíveis de flexão. Logo, sua analogia é completamente inútil e descabida nesse sentido.

    Em qualquer língua, uma determinada construção textual torna-se regra e se consolida como norma, no âmbito da língua CULTA, não em função única e exclusivamente do critério da estrutura anteriormente estabelecida de outra língua, mas sim de um USO, muitas vezes verificado como tendo origem em segmentos sociais diversos (não necessariamente do meio social mais culto e instruído). Quando o determinado uso de uma palavra, expressão ou construção sintática (até então sem amparo na normalização gramatical vigente) se verifica na literatura da língua ou na escrita/fala de seus usuários, os gramáticos tendem a aboná-la. É assim que sempre funcionou e assim que sempre fucionará. Não existe, em língua, esse papo de "DNA sucata" (que eu vou descontruir logo a seguir, mostrando o quanto sua argumentação é contraditória). Há apenas aquilo que é usado e o que cai em desuso. Simples assim!

    O que os gramáticos fazem é observar os usos e registrá-los. "Suficienta" e "restanta" não existem por não terem emprego percentual de peso na língua; presidenta sim.

    Você fica tentando explicar (baseado em suposições pessoais) motivos para não legitimar a palavra. Ora, é óbvio que não houve erro tipográfico, já que as ocorrências da palavra na obra de Castilho são inúmeras desde a primeira edição, mantendo-se até hoje. E mesmo que assim fosse, não se concentre em Castilho como se ele fosse a uma evidência isolada, equivocada e "insuficiente" sobre a palavra presidenta. Não se trata de mero "incidente isolado" e "insuficiente", como já foi demonstrado em mensagem anterior: a palavra estava dicionarizada EM PORTUGAL desde 1881 e usada pelo maior escritor brasileiro em 1882, tudo ainda em pleno século XIX. O único motivo que te leva desmerecer isso é a sua resistência orgulhosa em aceitar a legitimidade da palavra, nada mais.

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  8. E mesmo que assim não fosse, vamos à palavra cujo uso você tenta a todo custo negar sem ter conhecimento dos fatos.

    Que o termo „presidenta“ figure em dicionários lusitanos e outras obras não foi suficiente (ou “suficiento”, “suficienta”?) nem para dobrar a lógica do termo, nem para colocá-lo em uso.

    "Dobrar a lógica do termo"? Que lógica? A lógica latina? Essa lógica, por mais útil e importante que seja para se entender a forma como o português se moldou originalmente, serve de modo completo apenas para o próprio latim. Se o português e todas as línguas neolatinas mantivessem, por algum motivo, a estrutura inteiramente original do latim, nós continuaríamos a falar dialetos do latim, e não português, espanhol, francês, italiano etc, que, com suas respectivas evoluções, são hoje línguas, e não meros dialetos do latim.

    Percebe como você tenta vincular incondicionalmente e rigorosamente a língua que falamos e escrevemos hoje a uma língua sem conseguir explicar por que diabos deveríamos, por alguma obrigação constante numa lei ou mesmo em alguma argumentação científica, seguir os critérios de uma língua que não é usada no país? Não existe esse rigor, meu caro. Ele se encontra apenas no capricho de quem pretende manter uma suposta ETIQUETA linguística que, na prática social, perde totalmente o sentido e a razão de ser. Isso que você defende (ou melhor, tenta desqualicar) é mero juízo de valor. Tenta a todo custo preservar algo que já sofreu transformação. Condenar uma palavra não impede que a natureza espontânea da linguagem a consagre e a torne normalizada, correta e culta, como já aconteceu, pois os principais gramáticos da língua (repito) já registram a forma como adequada em suas obras.

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  9. Você disse que "Os dicionários são como os genomas. Eles absorvem as 'mutações' da língua, mas a maioria dessas 'mutações' não entra em uso." E tocou na palavrinha mágica: uso. É justamente o uso o que, mais cedo ou mais tarde, é contado como critério para que uma palavra não apenas seja dicionarizada como também enquadrada na norma culta. E por quem? Pelos gramáticos.

    Você também disse "[...]nem para colocá-lo em uso"

    E por que você acha que ela não foi sequer ainda colocada em uso? Dilma Rousseff não inventou essa palavra! Ela já era usada em jornais, tribunais, órgãos públicos há muitas décadas. A novidade não é a forma feminina de presidente. A novidade é uma mulher nesse cargo do Executivo. Comprova-se, em vários meios e épocas, o hábito de se escrever esse feminino, cujas ocorrências tornaram-se mais frequentes na medida em que as mulheres passaram a assumir cargos de presidência. Duvida? No âmbito jornalístico, constam incontáveis registros do uso do termo, conforme pode ser constatado por meio das ferramentas de buscas dos sites de jornais. Só vou citar aqui ALGUNS exemplos. O Correio Braziliense possui em seus registros virtuais: “Já confirmaram presença no vernissage o ministro do Meio Ambiente, José Sarney Filho, e a presidenta do Ibama, Marília Marreco Cerqueira” (1999). Em outra edição, consta: “Ciclo de palestras com a participação da Dra. Ruth Cardoso, presidenta do Conselho do Comunidade Solidária” (1999). Em mais outra edição, temos: “A presidenta do Sindicato dos Comerciários, Geralda Godinho, diz que a categoria é a favor do novo horário” (2002).
    Consultando o site de O Estado de S. Paulo, podemos encontrar, entre mais de SETECENTOS registros: “Coordenada pela presidenta da Sociedade Brasileira de Arqueologia, Tania Andrade, a mostra permanecerá aberta ao público até o próximo dia 30 de julho.” (2000).
    No site da Folha de S. Paulo – jornal que anunciou a utilização exclusiva de presidente para se referir à Dilma Roussef – encontram-se arquivos de edições anteriores com CENTENAS de registros contrariando o tão defendido substantivo de dois gêneros, como este: “[...] Sílvia Passarelli, empresária e presidenta da construtora Passarelli [...]” (1994). Em outra ocorrência, temos: “A presidenta do partido conservador oposicionista CDU (União Democrata-Cristã), Angela Merkel [...]” (2000).
    No âmbito do Poder Judiciário, o vocábulo pode ser observado em documentos oficiais. Em Ata de Sessão Solene realizada no Superior Tribunal de Justiça, datada de 1989, consta: “(...) à Desembargadora Maria Tereza Braga, Presidenta do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (...)”. No site do Superior Tribunal de Justiça (STJ), encontram-se vários registros como este: “A juíza Sandra de Santis, então presidenta do Tribunal de Júri, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, desclassificou a imputação de crime doloso, passando-a para lesão corporal seguida de morte” (1999).
    Não é de se estranhar, portanto, que a linguista Maria Helena de Moura Neves tenha registrado em seu Guia de Usos do Português (2003): “usa-se a forma presidente tanto para homem quanto para mulher. [...] Também é usual, entretanto, a forma regular de feminino, presidenta. >> 'Afinal, era dar ou não dar a renúncia da PRESIDENTA da Argentina' (Nos Bastidores da Notícia, de Alexandre Garcia)" (p. 620).
    Veja só: não estamos falando, aqui, do uso de "Presidenta" por analfabetos ou pessoas de pouca instrução, mas por jornalistas, juízes, camada CULTA da sociedade. Viu só? Quer você queira, quer não, USA-SE a palavra – e há tempos! – no âmbito da linguagem culta. Ou seja: dizer que "presidenta" não se USA no âmbito da língua CULTA não tem sustentação.

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  10. Você disse que "esse termo é simplesmente [...] considerado errado em Portugal." E daí? Mesmo que fosse errada em Portugal (a palavra "presidenta" encontra devidamente dicionarizada em vários dicionários portugueses), isso não vale como argumento para desqualificá-la no Brasil. Há formas em português tidas como corretas em Portugal e que não possuem uso em nosso país (e vice-versa). Não há nenhuma razão para se negar a legitimidade de uma palavra AQUI só porque, no país do qual herdamos a língua, a forma não existia ou não era usada (e já mostramos que isso não é verdade).

    Uma língua, ao ser usada em outro lugar/país, pode naturalmente criar formas e estruturas estranhas ao lugar onde era originalmente falada. Como, estando em outro continente separado por um imenso oceano, poderia se esperar que o português falado e escrito no Brasil pudesse continuar a ser o mesmo português pronunciado em Portugal? É algo tão claro, tão óbvio... Não reconhecer que uma língua evolui, VARIA e MUDA conforme o tempo, conforme o seu contexto histórico, geográfico etc. é demonstrar total ignorância e principalmente, teimosia diante de estudos linguísticos que já comprovaram e normalizaram a forma como correta, e basear-se apenas em opiniões 'embasadas' em preferências e inclinações de gosto, e não em ciência.

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  11. Você disse "Estima-se que apenas cerca de 10% do nosso genoma constitui informação genética útil, o restante [...] é 'DNA sucata'...".

    Já que você fez uma analogia própria de ciência exata ("genoma", "informação genética útil" "DNA") de modo a tentar explicar o que ocorre num objeto próprio das ciências humanas, vamos lá: mesmo que validássemos essa estratégia esquisita de comparar o português moderno com latim clássico (aquele de Cícero e outros grandes nomes da literatura clássica da Antiguidade), você continuaria equivocado, já que é ponto pacífico na filologia que as línguas neolatinas (português, espanhol, francês, italiano) NÃO evoluíram do chamado latim clássico (apesar da relatinização ocorrida durante o Renascimento). Elas evoluíram do latim vulgar, o mesmo latim que, se seguirmos seu próprio raciocínio, chamaremos de "DNA sucata".

    Repetindo para evidenciar seu próprio argumento contra você: o português NÃO se originou no latim clássico e culto, mas sim do latim vulgar, ou seja, o latim de "DNA sucata".

    Isso poderia até parecer um fato irrelevante, mas não é, porque a diferença entre o latim da elite romana e o falado pelos soldados e pela plebe era brutal. Sim, o latim vulgar falado pelos soldados e pela plebe (do qual se originou o português, o espanhol, o francês etc) é o latim "DNA sucata", e não o latim clássico.

    Nada acima deprecia ou depõe contra o latim. E seria estupidez não reconhecer a importância dessa língua morta, que continua sendo estudada no Brasil sim, como disciplina dos departamentos de linguísticas de inúmeras universidades do país. No entanto, dizer que "o latim continua vivo" é afirmação meramente romântica, pois, mesmo que ele ainda estivesse vivo e sendo falado por meio de usuários, isso não faria diferença na evolução do português, espanhol etc, que se tornaram línguas independentes e com estruturas próprias. NÃO SEGUIMOS A ESTRUTURA SINTÁTICA DO LATIM (sujeito>objeto>verbo) Em português, a estrutura VARIOU e depois MUDOU, EVOLUIU para outra forma (sujeito>verbo>objeto). Como, ainda assim, teimar e querer vincular incondicionalmente uma à outra?

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  12. Veja só como o raciocínio que você usa não favorece seu próprio argumento: "lógica interna de uma língua" pressupõe uma lógica peculiar, inerente a cada língua. Ora, o latim tem a sua lógica interna, assim como o português e qualquer outra língua. Isso apenas reforça o que eu disse no parágrafo anterior.

    Os exemplos de feminino das demais línguas originadas do latim estão lá, firmes e fortes (e você até agora só defendeu a lógica da estrutura latina no português, ignorando que isso também ocorre nas demais línguas neolatinas). Você já constatou o quanto elas também VARIAM e MUDAM independentemente de sua raiz latina. E aí...? Ou é só pro português que funciona essa "regra" imaginária e idealizada?...

    Declarações que você faz tentando defender a língua culta dela mesma, carentes de qualquer fundamentação científica, não passam de meros juízos de valores, que são superados em geração em geração. Seus filhos, netos, bisnetos etc encararão diversas "mutações à brasileira" (dê o nome que quiser, as mutações são legítimas, naturais e espontâneas, e não subordinadas a alguma lei ou princípio típico de ciências exatas) como meras normas próprias da língua culta. De nada adianta tentar fixar, tal qual um modelo enrijecido, uma estrutura que nem mesmo diz respeito à natureza da própria língua.


    Afirmações como "mutação à brasileira" demonstram ainda puro preconceito e preferência pessoal. Por que tal mutação, ainda que fosse exclusivamente "à brasileira", não poderia ser reconhecida e legitimada? Por que diabos a língua falada em Portugal teria mais legitimidade do que o português falado no Brasil, a ponto de legislar e condenar uma forma usada (e consagrada em regra gramatical!) aqui só porque não é usada lá? Se assim fosse, deveriam também ter sido condenadas, na Antiguidade, as formas oriundas do latim vulgar (latim DNA sucata), que deram origem a todo um universo de palavra que compõem o português, o espanhol etc. E, no entanto, se isso aconteceu, de nada adiantou, porque o que legitima as palavras é o seu uso e não uma receita erudita de etiqueta linguística e nem mesmo alguma lei.

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  13. Entendo que para um corretor de textos como você, essa discussão toda seja muito interessante, instigante, e até mesmo de importância existencial.

    Outro dia encontrei um angolano nas ruas de Heidelberg, aproveitei e fiz uma consulta "gramatical". Lá em Angola a mutação "presidenta" também é considerada errada. Se em Portugal e Angola é errado, mas no Brasil é certo, então é a "mutação à brasileira".

    Se a questão fosse defender flexão de gênero e imparcialidade "científica", ou ser "justo", em vez de "preconceituoso", deveríamos aceitar também o "presidento" como mutação válida. Mas não, a questão parece ser muito mais ideológica que gramatical, uma homenagem especial à brasileira Dilma, a "mutação à brasileira".

    Não me entenda mal, a genética ensina que toda mutação é "neutra", em princípio, que o ambiente determina se uma mutação "pega" ou não. Só não entendo por que não inventaram o "presidento" para o presidente Lula da Silva? Talvez os seus filhos e netos ainda inventarão essa e, com alto grau de certeza, você deverá defender esse uso.

    O número de mutações, assim como o universo e a ignorância humana são infinitos, por isso criam-se enzimas de reparo de DNA nos sistemas vivos, e na cultura criam-se regras, conceitos, pré-conceitos e pós-conceitos.

    Sua observação que do latim surgiram as línguas neolatinas é procedente e reforça meu ponto de vista inicial. A história mostra que a destruição e a formação das línguas andam de mãos dadas com a destruição e a formação das nações, dos países e das culturas. As gigantescas contradições brasileiras também dividem o país, desde o início da sua formação. Em princípio, não vejo mal algum nisso, é um sintoma da evolução natural, que às vezes é apressada, às vezes retardada.

    Pessoalmente, gostaria que Canudos e o "canudês" tivessem vencido as tropas federais e se tornado independentes, que as diversas outras tentativas de insurreição que marcaram a nossa história tivessem prosperado, e que de cada uma tivesse resultado nova língua ou dialeto, nova cultura, nova nação, novo povo, novo território, novo governo. Vivendo assim, em novos ambientes coerentes, cada um de nós estaria mais protegido dos erros que a todo momento querem que aceitemos como verdades.

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